"E um dia, quando souberes
Que este gaúcho morreu
Nalgum livro serás eu
E nesse novo viver
Eu somente quero ser
A mais apagada imagem
Deste Rio Grande selvagem
que até morto hei de querer"
(Jayme Caetano Braun)
É em 30 de janeiro que se comemora, no Rio Grande do Sul, o Dia do Pajador Gaúcho.
A data é uma homenagem (Lei 11.676, de 16/10/2001) ao maior pajador gaúcho: Jaymem Caetano Braun.
Ele nasceu nesta data, na Timbaúva (hoje Bossoroca), na época distrito de São Luiz Gonzaga, nas Missões, em 1924. Morreu a 08/07/1999 em Porto Alegre.
A pajada (ou payada) é uma forma poética nascida na campanha argentina e uruguaia no século XIX, em geral um repente em décima (estrofe de 10 versos), de redondilha maior (verso de 7 sílabas) e rima entrelaçada (todos os versos rimam entre si, alternadamente). Suas raízes remontam aos romances e quadras medievais e renascentistas, de temática popular, trazidos pelos povoadores espanhóis. O pajador é o artista da pajada, que canta seus versos de improviso.
Para comemorar a data, aconteceu dia 30/01/2011, em Bento Gonçalves, o Encontro dos Pajadores. A cidade abria o evento desde o ano passado. Antes disso, por dez anos, o espetáculo foi realizado em Porto Alegre. No show, se apresentaram os pajadores Adão Bernardes, José Estivalet, Paulo Mendonça, Jadir Oliveira, Pedro da Fontoura e Renato Kruel.
Fonte: jornal Zero Hora, Almanaque Gaúcho, Luiz Carlos Domingues 29/01/2011.
Bochincho
Autoria: Jayme Caetano Braun
A um bochincho - certa feita,
Tenho visto coisa feia,
Fui chegando - de curioso,
Tenho visto judiaria,
Que o vício - é que nem sarnoso,
Mas ainda hoje me arrepia
nunca para - nem se ajeita.
Lembrar aquela peleia,
Baile de gente direita
Talvez quem ouça - não creia,
Vi, de pronto, que não era,
Mas vi brotar no pescoço,
Na noite de primavera
Do índio do berro grosso
Gaguejava a voz dum tango
Como uma cinta vermelha
E eu sou louco por fandango
E desde o beiço até a orelha
Que nem pinto por quireral.
Ficou relampeando o osso!
Atei meu zaino - longito,
O índio era um índio touro,
Num galho de guamirim,
Mas até touro se ajoelha,
Desde guri fui assim,
Cortado do beiço a orelha
Não brinco nem facilito.
Amontoou-se como um couro
Em bruxas não acredito
E aquilo foi um estouro,
'Pero - que las, las hay',
Daqueles que dava medo,
Sou da costa do Uruguai,
Espantou-se o chinaredo
Meu velho pago querido
E amigos - foi uma zoada,
E por andar desprevenido
Parecia até uma eguada
Há tanto guri sem pai.
Disparando num varzedo!
No rancho de santa-fé,
Não há quem pinte o retrato
De pau-a-pique barreado,
Dum bochincho - quando estoura,
Num trancão de convidado
Tinidos de adaga - espora
Me entreverei no banzé.
E gritos de desacato.
Chinaredo à bola-pé,
Berros de quarenta e quatro
No ambiente fumacento,
De cada canto da sala
Um candieiro, bem no centro,
E a velha gaita baguala
Num lusco-fusco de aurora,
Num vanerão pacholento,
Pra quem chegava de fora
Fazendo acompanhamento
Pouco enxergava ali dentro!
Do turumbamba de bala!
Dei de mão numa tiangaça
É china que se escabela,
Que me cruzou no costado
Redemoinhando na porta
E já sai entreverado
E chiru da guampa torta
Entre a poeira e a fumaça,
Que vem direito à janela,
Oigalé china lindaça,
Gritando - de toda guela,
Morena de toda a crina,
Num berreiro alucinante,
Dessas da venta brasina,
Índio que não se garante,
Com cheiro de lechiguana
Vendo sangue - se apavora
Que quando ergue uma pestana
E se manda - campo fora,
Até a noite se ilumina.
Levando tudo por diante!
Misto de diaba e de santa,
Sou crente na divindade,
Com ares de quem é dona
Morro quando Deus quiser,
E um gosto de temporona
Mas amigos - se eu disser,
Que traz água na garganta.
Até periga a verdade,
Eu me grudei na percanta
Naquela barbaridade,
O mesmo que um carrapato
De chínaredo fugindo,
E o gaiteiro era um mulato
De grito e bala zunindo,
Que até dormindo tocava
O gaiteiro - alheio a tudo,
E a gaita choramingava
Tocava um xote clinudo,
Como namoro de gato!
Já quase meio dormindo!
A gaita velha gemia,
E a coisa ia indo assim,
Ás vezes quase parava,
Balanceei a situação,
De repente se acordava
- Já quase sem munição,
E num vanerão se perdia
Todos atirando em mim.
E eu - contra a pele macia
Qual ia ser o meu fim,
Daquele corpo moreno,
Me dei conta - de repente,
Sentia o mundo pequeno,
Não vou ficar pra semente,
Bombeando cheio de enlevo
Mas gosto de andar no mundo,
Dois olhos - flores de trevo
Me esperavam na do fundo,
Com respingos de sereno!
Saí na Porta da frente...
Mas o que é bom se termina
E dali ganhei o mato,
- Cumpriu-se o velho ditado,
Abaixo de tiroteio
Eu que dançava, embalado,
E inda escutava o floreio
Nos braços doces da china
Da cordeona do mulato
Escutei - de relancina,
E, pra encurtar o relato,
Uma espécie de relincho,
Me bandeei pra o outro lado,
Era o dono do bochincho,
Cruzei o Uruguai, a nado,
Meio oitavado num canto,
Que o meu zaino era um capincho
Que me olhava - com espanto,
E a história desse bochincho
Mais sério do que um capincho!
Faz parte do meu passado!
E foi ele que se veio,
E a china - essa pergunta me é feita
Pois era dele a pinguancha,
A cada vez que declamo
Bufando e abrindo cancha
É uma coisa que reclamo
Como dono de rodeio.
Porque não acho direita
Quis me partir pelo meio
Considero uma desfeita
Num talonaço de adaga
Que compreender não consigo,
Que - se me pega - me estraga,
Eu, no medonho perigo
Chegou levantar um cisco,
Duma situação brasina
Mas não é a toa - chomisco!
Todos perguntam da china
Que sou de São Luiz Gonzaga!
E ninguém se importa comigo!
Meio na volta do braço
E a china - eu nunca mais vi
Consegui tirar o talho
No meu gauderiar andejo,
E quase que me atrapalho
Somente em sonhos a vejo
Porque havia pouco espaço,
Em bárbaro frenesi.
Mas senti o calor do aço
Talvez ande - por aí,
E o calor do aço arde,
No rodeio das alçadas,
Me levantei - sem alarde,
Ou - talvez - nas madrugadas,
Por causa do desaforo
Seja uma estrela chirua
E soltei meu marca touro
Dessas - que se banha nua
Num medonho buenas-tarde!
No espelho das aguadas!
Galo de Rinha
Autoria: Jayme Caetano Braun
Valente galo de rinha,
guasca vestido de penas!
Quando arrastas as chilenas
No tambor de um rinhedeiro,
No teu ímpeto guerreiro
Vejo um gaúcho avançando
Ensangüentado, peleando,
No calor do entreveiro !
Pois assim como tu lutas
Frente a frente, peito nu.
Lutou também o chiru
Na conquista deste chão...
E como tu sem paixão
Em silêncio ferro a ferro,
Cala sem dar um berro
De lança firme na mão!
Evoco neste teu sangue
Que brota rubro e selvagem.
Respingando na serragem,
Do teu peito descoberto,
O guasca de campo aberto,
De poncho feito em frangalhos.
Quando riscava os atalhos
Do nosso destino incerto!
Deus te deu , como ao gaúcho
Que jamais dobra o penacho,
Essa de altivez de índio macho
Ques ostentas Já quando pinto:
E a diferença que sinto
E que o guasca bem ou mal!
Só lutas por um ideal
E tu brigas pôr instinto!
Pôr isso é que numa rinha
Eu comtigo sofro junto,
Ao te ver quase defunto.
De arrasto , quebrado e cego,
Como quem diz Não me entrego:
Sou galo, morro e não grito
Cumprindo o fado maldito
Que desde a casca eu carrego!
E ao te ver morrer peleando
No teu destino cruel.
Sem dar nem pedir quarteu.
Rude gaúcho emplumado.
Meio triste , encabulado,
Mil vezes me perguntei
Pôr que é que não me boleei
Pra morrer no teu costado?
Porque na rinha da vida
Já me bastava um empate!
Pois cheguei no arremate
Batido , sem bico e torto ..
E só me resta o conforto
Como a ti, galo de rinha
Que se alguem me
dobrar - me a espinha
Há de ser depois de morto!
guasca vestido de penas!
Quando arrastas as chilenas
No tambor de um rinhedeiro,
No teu ímpeto guerreiro
Vejo um gaúcho avançando
Ensangüentado, peleando,
No calor do entreveiro !
Pois assim como tu lutas
Frente a frente, peito nu.
Lutou também o chiru
Na conquista deste chão...
E como tu sem paixão
Em silêncio ferro a ferro,
Cala sem dar um berro
De lança firme na mão!
Evoco neste teu sangue
Que brota rubro e selvagem.
Respingando na serragem,
Do teu peito descoberto,
O guasca de campo aberto,
De poncho feito em frangalhos.
Quando riscava os atalhos
Do nosso destino incerto!
Deus te deu , como ao gaúcho
Que jamais dobra o penacho,
Essa de altivez de índio macho
Ques ostentas Já quando pinto:
E a diferença que sinto
E que o guasca bem ou mal!
Só lutas por um ideal
E tu brigas pôr instinto!
Pôr isso é que numa rinha
Eu comtigo sofro junto,
Ao te ver quase defunto.
De arrasto , quebrado e cego,
Como quem diz Não me entrego:
Sou galo, morro e não grito
Cumprindo o fado maldito
Que desde a casca eu carrego!
E ao te ver morrer peleando
No teu destino cruel.
Sem dar nem pedir quarteu.
Rude gaúcho emplumado.
Meio triste , encabulado,
Mil vezes me perguntei
Pôr que é que não me boleei
Pra morrer no teu costado?
Porque na rinha da vida
Já me bastava um empate!
Pois cheguei no arremate
Batido , sem bico e torto ..
E só me resta o conforto
Como a ti, galo de rinha
Que se alguem me
dobrar - me a espinha
Há de ser depois de morto!
Natal Galponeiro
Autoria: Jayme Caetano Braun
A cuia do chimarrão,
É o cálice do ritual,
E o galpão é a Catedral
Maior da terra pampeana,
Que de luzes se engalana,
Para esperar o NATAL.
A cuia aquece na palma
Da mão da indiada campeira,
Dentro da sua maneira,
Rezando e chairando a alma,
Para recuperar a calma,
Que fugiu do mundo inteiro.
Enquanto o estrelão viajeiro,
Já vem rasgando caminho,
para anunciar o "Piazinho",
A Virgem e o Carpinteiro.
Em nome do Pai,
- Do Filho e do Espírito Santo,
É o chimarrão que levanto,
E o vento faz estribilho,
A prece do andarilho,
Ao Piazito Salvador,
Filho de Nosso Senhor,
Do Espírito e do Pai,
De volta a terra aonde vai,
Falar de novo em amor!
Tem sido assim - dois mil anos,
Ninguém sabe - mais ou menos,
Vem conviver com os pequenos,
De todos os meridianos,
E repetir aos humanos,
As preces de bem querer.
Quem sabe até - pode ser,
Que um dia seja atendido,
E o mundo velho perdido,
Encontre paz para viver.
Ele sabe da apertura,
Em que vive o pobrerio,
A fome - a miséria - o frio,
Porque passa a criatura,
Mas que - inda restam - ternura,
Amizade e esperança,
É que pode, a cada andança,
Mesmo nos ranchos sem pão,
Aliviar o coração,
Num sorriso de criança!
Pra mim - que ouvi na missões,
Causos de campo e rodeio,
Do "Negro do Pastoreio",
Cruzando pelos rincões,
Das lendas de assombrações,
E cobras queimando luz.
Foste - Menino Jesus,
O meu sinuelo de fé,
Juntando ao índio Sepé,
O Nazareno da Cruz!
E a Santa Virgem Maria,
Madrinha dos que não tem,
Fez parte - sempre - também,
Da minha filosofia,
Eu que fiz de Sacristia,
Os ranchos de chão batido,
E que hoje - encanecido,
Sou sempre o mesmo guri,
A bendizer por aí,
O pago que fui parido!
E o Nazareno que vem,
Das bandas de Nazaré,
Chasque divino da fé,
Rastreando a luz de Belém,
Ele que vai morrer também,
Pra cumprir as profecias.
É Natal - nasce o MESSIAS,
Salve o Menino Jesus!
Mas o que fogem da luz,
O matam todos os dias.
Presentes - "Papais Noéis",
Um ano esperando um dia,
Quando a grande maioria,
Sofre destinos cruéis.
O amor pesado a "mil-réis",
E mortos vivos que andam,
Instituições que desandam,
Porque esqueceram JESUS,
O que precisa, é mais luz,
No coração dos que mandam!
Que os anjos digam amém,
Para completar a prece,
Do gaúcho que conhece,
As manhas que o tigre tem.
Não jogo nenhum vintém,
Mesmo sendo carpeteiro,
Mas rezo um Te-Déum campeiro,
Nessa Catedral selvagem,
Pra que faça Boa Viagem,
O enteado do Carpinteiro!
É o cálice do ritual,
E o galpão é a Catedral
Maior da terra pampeana,
Que de luzes se engalana,
Para esperar o NATAL.
A cuia aquece na palma
Da mão da indiada campeira,
Dentro da sua maneira,
Rezando e chairando a alma,
Para recuperar a calma,
Que fugiu do mundo inteiro.
Enquanto o estrelão viajeiro,
Já vem rasgando caminho,
para anunciar o "Piazinho",
A Virgem e o Carpinteiro.
Em nome do Pai,
- Do Filho e do Espírito Santo,
É o chimarrão que levanto,
E o vento faz estribilho,
A prece do andarilho,
Ao Piazito Salvador,
Filho de Nosso Senhor,
Do Espírito e do Pai,
De volta a terra aonde vai,
Falar de novo em amor!
Tem sido assim - dois mil anos,
Ninguém sabe - mais ou menos,
Vem conviver com os pequenos,
De todos os meridianos,
E repetir aos humanos,
As preces de bem querer.
Quem sabe até - pode ser,
Que um dia seja atendido,
E o mundo velho perdido,
Encontre paz para viver.
Ele sabe da apertura,
Em que vive o pobrerio,
A fome - a miséria - o frio,
Porque passa a criatura,
Mas que - inda restam - ternura,
Amizade e esperança,
É que pode, a cada andança,
Mesmo nos ranchos sem pão,
Aliviar o coração,
Num sorriso de criança!
Pra mim - que ouvi na missões,
Causos de campo e rodeio,
Do "Negro do Pastoreio",
Cruzando pelos rincões,
Das lendas de assombrações,
E cobras queimando luz.
Foste - Menino Jesus,
O meu sinuelo de fé,
Juntando ao índio Sepé,
O Nazareno da Cruz!
E a Santa Virgem Maria,
Madrinha dos que não tem,
Fez parte - sempre - também,
Da minha filosofia,
Eu que fiz de Sacristia,
Os ranchos de chão batido,
E que hoje - encanecido,
Sou sempre o mesmo guri,
A bendizer por aí,
O pago que fui parido!
E o Nazareno que vem,
Das bandas de Nazaré,
Chasque divino da fé,
Rastreando a luz de Belém,
Ele que vai morrer também,
Pra cumprir as profecias.
É Natal - nasce o MESSIAS,
Salve o Menino Jesus!
Mas o que fogem da luz,
O matam todos os dias.
Presentes - "Papais Noéis",
Um ano esperando um dia,
Quando a grande maioria,
Sofre destinos cruéis.
O amor pesado a "mil-réis",
E mortos vivos que andam,
Instituições que desandam,
Porque esqueceram JESUS,
O que precisa, é mais luz,
No coração dos que mandam!
Que os anjos digam amém,
Para completar a prece,
Do gaúcho que conhece,
As manhas que o tigre tem.
Não jogo nenhum vintém,
Mesmo sendo carpeteiro,
Mas rezo um Te-Déum campeiro,
Nessa Catedral selvagem,
Pra que faça Boa Viagem,
O enteado do Carpinteiro!
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